Xícara de café

By Gilka

Contei para uma amiga que havia aquela situação nova. Como raramente acontece desde a minha separação, eu estava me sentido atraída por outro homem. Fisicamente apenas. As emoções ainda não estavam prontas para irem a leilão.

Tudo começou em um daqueles momentos íntimos – geralmente ocupados com lembranças de homens do passado ou esses que vem da internet diluídos em pixels, já sem calça e prontos para o uso. Inocente quanto ao perigo, fiz a asneira de pensar nessa criatura pela qual me sentia atraída em uma dessas ocasiões. E foi bom. Muito bom.

Apesar de estar quilos acima dos interesses dele, passei a burilar a idéia de investir na possibilidade. Não queria namoro, casamento ou sequer uma transa qualquer. Tinha que acontecer naturalmente, com vontade mútua e respeito. Era afinal, um terreno perigoso e eu não tinha a menor urgência.

Aí eu apresentei a amiga. E rolou um clima. Entre eles.

Há mais de quinze anos eu estive em um meio de campo parecido. Eu não era o tipo dele, já havia levado um sim (sem calças) e depois um não (com calças). (Ah, esse maldito feichecler…) Mesma história, apresentei a amiga e o clima entre eles aflorou. A então amiga, muito educada, me convidou para um café com a única intenção de perguntar se eu me importava. O cappuccino estava ótimo, e ficou melhor ainda como queimadura de segundo grau na cara dela.

Mas dessa vez foi diferente. A amiga (atual), muito elegante, não fez nenhum comentário ou sequer chegou perto dele. Eu levei alguns dias temporizando a história. E em menos de uma semana depois, o rapaz perdeu a mágica completamente. Eu achei umas fotos do Otto no site da tpm e a vida voltou ao normal. Tudo devidamente abotoado.

Sabe qual é? Não dá pra forçar a barra ou espreitar como uma sonsa. Se é pra ser especial, vai ser especial em todos os detalhes. Ficar sozinha é muito melhor do que beijar sem mágica, perder a amiga ou desperdiçar uma xícara de café.

O que a gente não enxerga

By Gilka

Sem entrar em muitos detalhes, há poucas semanas eu resolvi por um basta a uma relação de trabalho improdutiva e finalmente procurar um novo emprego. Ainda cumprindo o aviso prévio, comecei a perceber coisas que não percebia antes. A subordinação mascarada de lealdade. Humilhações aceitas em troca de segurança financeira. Eu poderia ter procurado uma saída antes, mas não o fiz por que aparentemente os problemas não eram tão problemáticos assim. Foram dez anos onde tudo era quase lindo, sem realmente ser.

Houve também aquele namoro de quatro anos que alimentava minha paranoia enquanto eu fingia não saber das amantes e flertes. Até o dia em que eu fui obrigada a fazer um desvio acidental e passar na frente do edifício dele para ver a porta automática da garagem se abrindo e revelando a outra bem sentada no banco do carona – às sete horas da manhã! Apesar de ter visto, até hoje não sei se enxerguei todos os cantos sombrios daquela experiência.

Antes que eu passe por estúpida, vou parar a lista de relatos por aqui. A questão é simples: tem coisas que a gente não enxerga. Tudo bem, a questão, na verdade, não é simples. A questão é por que resolvemos não enxergar certas coisas. Será esta cegueira uma virtude ou uma grande limitação?

Não enxergar pode ser um princípio de sobrevivência. Uma maneira de tornar a vida mais confortável e aceitar realidades que talvez não sejam tão fáceis de mudar. Mas depois duas experiências como as que relatei, comecei a me perguntar sobre outras coisas que estariam esquecidas na periferia do meu campo de visão.

Imagino que teus olhos estejam se virando para os lados agora. Os meus estão, ainda que a imagem não seja muito clara.

Deixa para o acaso

By Francine Desoux, do Opostos e Dispostos

Eu, assim como a maioria dos mortais, sigo uma rotina bastante corrida. De manhã, faculdade; à tarde, estágio; e, durante a noite, academia. A cada troca de turno percorro muitos caminhos e cruzo com pessoas a todo instante. Mas naquela noite não foi qualquer pessoa.

Depois de uma mudança repentina de planos, pulei o treino da academia e fui direto para uma rodada de cachaças com minhas amigas. Fomos a um bar, em Moema, que serve todo tipo de cachaça que você pode imaginar. O que não sabíamos era a programação da noite. Corinthians x São Paulo foi a trilha sonora, além de muitos gritos e xingamentos.

Em meio àquele mar de testosterona, cinco mulheres que só queriam encher a cara de cachaça e dar risadas. Os caras estavam com um olho na tela e outro na nossa mesa. Parecia aquelas cenas de filme americano, quando um grupo de desavisados entra em um bar de motoqueiros. A diferença é que não era exatamente soco que eles queriam nos dar…

Bom, mas entre tantos olhares, um em especial dominou minha atenção. O cara tinha olhos que leem a alma, parecia que a cada troca de olhares ele conhecia exatamente todos os meus pensamentos pecaminosos. Ele era lindo, tinha cabelo comprido, meio bagunçado à la Johnny Depp. Um sorriso lindo, um corpo incrível na medida certa.

Eram goles daqui, gols de lá e passamos a noite namorando à distância. Eu sorria para ele diante de qualquer besteira que uma das meninas falasse. Ele vibrava com o jogo e com cada mexida no cabelo que eu dava. Parecia que conversávamos sem emitir palavras, dançávamos sem sair de nossas cadeiras. Magia…

Passados 90 minutos de flerte, o São Paulo ganhou de 2 a 0 e a nossa partida terminou em empate sem gols. Nenhum dos dois partiu para o ataque – apesar de eu querer desesperadamente!

Com o fim do jogo ele seguiu para o caixa enquanto eu o seguia com os olhos na esperança de receber algum convite, mesmo que silencioso. Mas não. Ele pagou a conta e partiu! E partida ficou a minha cara! Não acreditei, aliás, ainda hoje não posso crer.

Preciso confessar uma coisa: voltei lá todas as noites de Brasileirão durante dois meses! E para desespero deste coração apaixonado nunca o encontrei. Decidi deixar para o acaso e abandonar minhas visitas à cachaçaria (não tinha mais grana nem fígado pra isso).

No dia seguinte o destino – ou o acaso, vai saber – me coloca no elevador do prédio em um horário atípico e ali, naquele metro quadrado,
Daquele dia em diante, peguei o mesmo elevador todos os dias. Afinal de contas, um dia a criança teria que estar gripadinha em casa com a mamãe enquanto o papai sai sozinho! Simples assim, sem escrúpulos mesmo. está uma mulher linda, com seu bebê lindo e seu marido lindo. O gato do Corinthians x São Paulo. Malditas mulheres lindas com seus bebês lindos.

Daquele dia em diante, peguei o mesmo elevador todos os dias. Afinal de contas, um dia a criança teria que estar gripadinha em casa com a mamãe enquanto o papai sai sozinho! Simples assim, sem escrúpulos mesmo.

Yes I am

By Gilka

I’m no artist, nor photographer
I’m no singer, nor composer
I’m no fashionista, nor slim
I’m no banker, nor prince
I’m no digital, nor recyclable
I’m no deal, nor money
I’m no tweet, nor tube
I’m no number, nor percentage
I’m no memory, nor password
I’m no activist, citizen of nowhere
I’m a lover without nos

Hora de trair o seu loiro

By Jan

Cerveja é igual homem: você está acostumada à mesmice do relacionamento. É sempre a mesma coisa. Sempre o mesmo script. Mesmo sabor. Mesma temperatura. Sempre igual. Sempre a mesma mesmice.

E aí, você conhece um cara diferente. Ele é diferente, muito diferente. Ele não é igual àqueles caras que você sempre tomou na sua vida. Ele te faz pensar que sua vida poderia ser mais saborosa. Ele é intrigante. Ele tem algo a mais. Você começa a pensar nele. E quer encontrá-lo novamente. E todas as vezes você começa a querer saber mais e mais sobre ele.

E o pior é quando você começa a descobrir que existem muitos tipos diferentes: uns mais interessantes que outros…

A sorte é que cerveja não é homem. E por isso, você não vai precisar se preocupar com as DRs ou de ficar com fama de promíscua.

Se você acha que tá na hora de trocar seu loirinho de sempre, eu sugiro que você troque por um outro loiro.

*****

O loiro que vou apresentar para vocês é um loiro feito de trigo chamado Witbier. Este rapaz belga se parece muito com aquele loiro que você conhece, o comum de todo boteco. Mas ele é um pouco mais delicado. Tem um perfume irresistível que conquista! Quando você prova ele pela primeira vez, verá que ele é bem leve, saboroso e não é amargo. Acho que é um ótimo candidato para sair da rotina. Ótima companhia para dias quentes e, por não ser enjoativo, é aquele cara que você passa muito tempo e não se cansa.

No mercado, os nomes mais comuns para esse loiro são: Hoegaarden, Estrella Damm Inedit, Blanche de Bruxelles e Grisette.

 

Como um filme

By Gilka

Como um filme. Foi isso que ele disse entre uma tragada e outra. Com aquela cara de quem tinha encontrado a explicação que tanto procurava para dizer tchau, fechar a porta do meu apartamento e ir embora para casa com a consciência limpa. Não importavam as incontáveis noites que passamos juntos, especialmente aquela de janeiro quando tudo começou. Não importavam as viagens que fizemos ou aquela sensação de plenitude de sentar ao seu lado enquanto ele dirigia. O frio cortante e os casacos elegantes que usamos na primeira viagem a Nova Iorque. Essas coisas não eram cinematográficas o suficiente, quiçá a cumplicidade magnética de nossos corpos.

O filme era uma historieta curta, muda, em preto e branco. Continuou a explicação enquanto meu sangue gelava. Ele já havia vivido aquilo com todas as outras, talvez os outros, talvez as coisas, qualquer uma das coisas daquela vida sem roteiro. Tudo rodava, repetia, terminava. Porque era um filme – zinho – tinha que acabar. Segundo ele, o final fora escrito para qualquer um, eu, ele e inclusive você. Lembro de debater, insistir, mas nada adiantou. As luzes se acenderam e a sessão acabou.

No mesmo ano eu vendi tudo o que tinha. Os discos, os móveis, o aparelho de som e o piano onde havia composto um trilha para um de seus filmes. Filmes de verdade daquele cineasta em formação. Atravessei o oceano e fui fazer cena em outro lugar, esquecer deste curta longa metragem.

Dez anos se foram e até hoje o tal do filme não entrou em cartaz sequer uma outra vez no meu cinema. Acredito também que nada do gênero tenha estrelado na vida desse ator. Que estava errado em suas projeções dentro e fora da tela.

Me acusaram de otimista

Hoje alguém me acusou de ser otimista. Ok, ok, não foi bem uma acusação, mas deu pra sentir que o otimismo é minha característica mais marcante para esse amigo – arrisco que ele vê isso como um pouco irritante e excessivo.

Tempos atrás uma conhecida disse que achava difícil eu me adaptar em um novo lugar, por ser tão séria e reservada. Pessoal que trabalha comigo me tem como um pouco insana, inconsequente e impulsiva. E muita gente me tira para responsável demais.

Múltiplas personalidades? Não, não, eu sou bem eu mesma, uma só. Acho que a imagem que a gente passa para o mundo acaba dependendo do grupo e da fase de vida. Provavelmente eu sou tudo isso que os outros pensam – em doses menores e mais equilibradas. Espero que sim! Ou talvez alguns deles só tenham me visto na TPM!

A gente faz o mesmo com os outros. Há algum tempo fui viajar com uma menina que conhecia havia três meses, com quem tive identificação imediata. Doze dias de viagem depois, a sorridente e saltitante recém-conhecida tinha se transformado numa quase-amiga emburrada. Com o tempo e a insistência, entendi que essas mudanças de humor fazem parte da personalidade dela – e acabamos virando muito-amigas.

Dia desses me disseram que eu não tinha sotaque – mas até então eu só havia dito “oi-tudo-bom”! A gente julga rápido demais. Dar chance para que as pessoas possam mostrar o melhor e o pior de si é conquistar a oportunidade de conhecer ótimos amigos e estabelecer relações sinceras. Só não dá pra fechar nossos olhos e ouvidos para as outras coisas boas (e más) que podem surgir.

 

Odeio poesia

By Gilka

Eu estava em surto e bati a tua porta suplicando uma chance e atenção.
Para achar a outra se despedindo sorrindo veneno de glória barata de gente sem coração.
Tua cara de culpa de sexo mal feito em pedaços de papel rasgados pelo chão.
Gente que transa. Trama cama pela simples conquista gozada e possessão.
A dor de enfarte, a visão opaca, minhas mãos cerradas atirando objetos na tua direção.
A náusea do cheiro fluido passado futuro rasgado nessa imunda traição.
E quando tudo estava esparramado parei de odiar e nunca mais amei o bastante.
Perdi a rima naquela tarde de agosto. Perda sem reversão.

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